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13/12/21 às 11h23 - Atualizado em 6/10/22 às 12h45

Memória/Festa para “Meteorango Kid”

Texto Lúcio Flávio. Edição: Sérgio Maggio (Ascom/Secec)

13.12.21

11:00:00

 

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Marco do cinema de invenção, “Meteorango Kid – Herói Intergalático” fez a cabeça de toda uma geração. Realizado pelo baiano, André Luiz Oliveira, então um jovem de 21 anos cheio de inquietações e angústias, durante o endurecimento da ditadura militar, no final dos anos 1960, o filme, hoje, cinquentão, é um dos homenageados da 54ª edição do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro (FBCB).

 

Será lembrado por meio de documentário disponível, gratuitamente, até o dia 14, na plataforma InnSaei.TV, dentro da mostra paralela Memória e Linguagens. Programa simplesmente imperdível para os amantes do audiovisual e por vários motivos.

 

O filme pode ser visto gratuitamente na plataforma InnSaei.TV.

 

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Programação – 54º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro

 

Veja a linha do tempo

A edição 54 – 2021

 

Um deles é que “Procura-se Meteorango Kid Vivo ou Morto”, dos diretores Marcel Gonnet e Daniel Fróes, faz justiça à devida importância histórica e cinematográfica da obra que, passados mais de cinco décadas, ainda impacta como experimentação estética. A outra, a do resgate em si desse petardo e da figura de seu autor aos olhos dos novos realizadores.

 

O título, claro, que entre outras coisas, assimila a rebeldia tão espontânea e vigente da período, é pura curtição. É um trabalho que marcou época pela maneira despojada com que captou os anseios e frustrações de momento problemático do país, mas também como força criativa.

 

foto: Divulgação

Cartaz do Filme “Meteorango Kid”

“Foi o filme da virada iconoclasta do cinema brasileiro, revelando uma geração ligada à contracultura”, resgata o curador da 54ª edição do FBCB, Sílvio Tendler. “Tudo ali cheirava revolucionário e novo no pior momento da ditadura”, reflete.

 

A ideia de realizar um documentário sobre como surgiu um dos filmes mais representativos do cinema nacional e, a partir daí, perfilar a vida, trajetória artística, dilemas e conquistas de seu criador, nasceu nos círculos acadêmicos. Nos meandros da Universidade Federal Fluminense (UFF), após muitas conversas entre o professor de psicologia, pesquisador Rafael Dias e os então estudantes de cinema e atualmente cineastas Daniel Fróes e Marcel Gonnet, este último peruano crescido na Argentina e, como os outros, baianos de nascimento, radicados no Rio.

 

“A ideia do documentário é apresentar a atmosfera desse momento e como esse personagem nos ajuda a entender o presente quando avaliamos esse arco temporal de 50 anos”, comenta Dias, que acabou estreitando relações de amizade com André Luiz Oliveira. “Para André Luiz, que fez o filme com 21 anos, esse personagem foi um peso difícil de carregar. O documentário investiga a força criativa da juventude e a coragem de criar”, reforça ainda.

 

Para o codiretor, Daniel Fróes, que viu “Meteorango” pela primeira vez na faculdade de cinema, e odiou tudo, sobretudo o personagem, hoje, claro, opina diferente. “É um filme muito ousado, que dialogava com as pessoas. Acho que essa ousadia da juventude é importante, estimula e cria discussões”, rever.

 

“Entendi que o personagem era uma representação do momento conturbado de alguns jovens da época e o documentário traduz essa descoberta e significados, essa confusão da época, o desbunde, o desespero, a vontade de fazer”, constata.

 

OUSADIAS POP

 

Além de conversas bem confessionais e reveladoras com o pai da criança, André Luiz Oliveira, o documentário traz também depoimentos dos atores que participaram dessa experiência singular – entre eles, Lula Martins, que viveu o protagonista -, dos participantes da equipe técnica, além das irmãs do diretor e nomes de peso da cultura baiana e nacional como Edgar Navarro, Gilberto Gil, Walter Carvalho Marcelo D2, Morais Moreira e tantos outros.

 

“Não tirei ‘Meteorango’ da cartola, foi uma combinação de coisas, expelindo o que me incomodava”, confessa André Luiz Oliveira no documentário. “Esse personagem foi um encosto de geração que expressava aquilo que estava acontecendo”, emenda, ao som de guitarras e cítaras, sinais tão em voga naquele 68/69.

 

O enredo. No dia do seu aniversário, Lula (Lula Martins) passa por experiências reais e surreais, como a de aparecer crucificado em plena praia de Itapuã. É um rebelde sem causa – ou não -, enfim, a quintessência da vanguarda em pessoa, o retrato típico do jovem classe média da capital baiana que dividia opiniões por conta de suas ousadias pop anárquicas e irreverentes.

 

 

 

O discurso e ações que propaga ao longo da fita, pode não parecer, mas é o termômetro das inseguranças e revoltas que o cercam. “Lula, tu é um pão, meu amor”, tira sarro diante do espelho. “Na capital do mundo tudo barra limpa”, após altercação com o pai na sala de jantar.

 

“Muitos jovens se identificavam com o personagem Lula”, confessa o cineasta baiano, Edgar Navarro, como tantos outros, “filhos proibidos” daqueles anos de chumbo.

 

O diálogo intenso e visceral de “Meteorango Kid”, influenciado por “O Bandido da Luz Vermelha”, de Rogério Sganzerla, – outro manifesto de protesto e rebeldia da época – com tudo que acontecia nas artes brasileiras no pós-68, é mostrado em “Vivo e Morto” por meio de epifanias e recordações surpreendentes. Muita gente sabe, por exemplo, que o título do filme nasceu da música homônima escrita pelo baiano, Tuzé de Abreu, mas não que o icônico cartaz do filme, concebido pelo artista visual, Rogério Duarte, representava uma carta de tarô.

 

“A atmosfera final do filme, o esotérico com coisas de apocalipse, seres não identificados, quem trouxe, foi o Rogério Duarte”, confessa André, que abraçou de vez o cinema após encontrar escondida, em casa, uma câmera para bolex do pai. “O cinema era o lugar que me recolhia desse mundo que achava esquisito”, desabafa o cineasta, que debutou em 1969 com o curta, “Doce Amargo”, leitura poética sobre um vendedor de pirulitos.

 

Detalhes da participação dos novos baianos na trilha sonora de “Meteorango”, o impacto do movimento tropicalista e da efervescente cena cinematográfica vigente, a presença do saudoso Márcio Curi na realização de Meteorango Kid, o sucesso e prêmios conquistados na quinta edição do Festival de Brasília – com direito a Candango entregue pela diva Leila Diniz -, a censura, passagem por Londres, a quase morte depois de um coma, prisão, a aventura de filmar José de Alencar na Amazônia, a vida nova na capital brasileira a partir de 1991.

 

“Eu sobrevivi”, reavalia André Luiz Oliveira, que voltaria a ser premiado em Brasília com “Loucos por Cinema”, em 1994. “Eu só me reconciliei com ‘Meteorango’, quando fiz ‘Loucos por Cinema’”, confessa.

 

Assessoria de Comunicação da Secretaria de Cultura e Economia Criativa (Ascom/Secec)

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