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12/12/21 às 12h28 - Atualizado em 6/10/22 às 12h45

Opinião/Tragédia social invisível

Texto Lúcio Flávio. Edição: Sérgio Maggio (Ascom/Secec)

12.12.21

14:00:00

 

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Eles são os donos da terra há pelo menos 500 anos. Contudo, após cinco séculos da descoberta da existência dos povos indígenas, no Brasil, além de reduzidos drasticamente em números populacionais, as tribos continuam invisíveis e negligenciadas pela sociedade. Pior. Descaracterizados de suas culturas e costumes, muitos indígenas vivem, hoje, perdidos numa realidade paralela em que tradições, línguas e identidade se enroscam numa ciranda triste de perda e resistência entre algum lugar do passado e o presente incômodo. O futuro está longe de ser uma possibilidade, pelo menos é o que aponta o documentário goiano, “De Onde Viemos, Para Onde Vamos”, de Rochane Torres.

 

O filme pode ser visto gratuitamente na plataforma InnSaei.TV.

 

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Programação – 54º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro

 

Veja a linha do tempo

A edição 54 – 2021

 

Rodado na Aldeia de Santa Isabel do Morro, na Ilha do Bananal, Tocantins, o filme, um dos destaques da mostra competitiva do 54º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, nasceu de um encontro inesperado da cineasta com os povos Iny, em 2017.

 

Após filmagens, no local, realizadas entre 2018 e 2019, Rochane Torres juntou tudo o que viu, presenciou e sentiu ao seu estilo experimental adquirido a partir de referências do cinema soviético, performances glauberianas e instantes impressionistas dos irmãos Lumière, criando uma obra-denúncia.

 

crédito: arquivo pessoal

A diretora Rochane

“O que me motivou a fazer esse filme foi o encontro com o desconhecido”, conta Rochane Torres, que também assina o roteiro e a montagem do projeto. “Busco um conceito antes do tema, a imagem irrepreensível, capturar instantes flagrados ou acidentais, a performance diante da câmera, é na montagem que defino o roteiro”, detalha Rochane Torres.

 

É o primeiro longa-metragem goiano na mostra competitiva do Festival de Brasília e o documentário compartilha, por meio de blocos temáticos, o dia a dia dos Iny da Ilha do Bananal. Pejorativamente chamados de karajá – macaco preto – são povos que há séculos vivem às margens do rio Araguaia entre os estados de Goiás, Tocantins e Mato Grosso. São conhecidos pelos trabalhos com bonecas de cerâmicas, pescaria familiar e rituais realizados em encontros, cheios de plumas e tintas como a “Festa de Aruanã” e “Casa Grande”.

 

Como se fosse um ouvinte atento e interessado, a câmera é um agente social poderoso na narrativa do filme, captando imagens de contrastes que chocam diante da ruidosa interferência dos brancos na vida da aldeia. Algo, por sinal, que já se tornou corriqueiro de se ver e que é marginalizado ou interpretado de forma equivocada e preconceituosa por boa parte da sociedade. São jovens com cortes de cabelos da moda, celulares na mão, chuteiras no pé, se aventurando, um ou outro, em passeios de motos na calada da noite, sob o sol do dia.

 

 

Não bastasse esse aviltamento da própria cultura e identidade sofrido por meio do “progresso”, ainda tem o assédio promovido por religiões e as questões da terra. Uma luta antiga que envolve a lei do mais forte e o estado de impunidade que há anos perdura quando o assunto são os povos indígenas ou qualquer minoria que se preze no Brasil. Para agravar ainda mais esse cenário de abandono e desalento, nos últimos tempos os povos da região veem sofrendo com crescente onda de suicídio.

 

“Não é da nossa cultura esse tal de suicídio, ela foi copiada de muito branco”, diz, indignado um representante da aldeia que perdeu a esposa.

 

“Primeiro veio o rádio, depois a tevê que mostrava as imagens, então muito de nós se esqueceram de trabalhar na roça de toco, de caçar. O problema da terra não está resolvido. O latifúndio continua sendo mal. O Mal”, lamenta um dos líderes do grupo.

 

Comovente e até esclarecedor o depoimento de uma jovem Iny que, ao contrário da maioria dos pares de sua idade, tem plena consciência do drama vivido por seu povo. Uma tragédia social silenciosa de proporções dantesca que parece não ter fim ou mesmo longe de findar. Daí a relevância inegável do documentário e desse registro urgente da situação. “O que mudou a minha realidade foi o estudo, possibilitando ver que não éramos inferiores ou diferentes”, desabafa. “Nem todos os jovens da aldeia conseguem fazer essa assimilação, são anos de processo histórico de lamentação”, continua.

 

CURTAS EM DESTAQUE

Credito Divulgação

“N.F.Trade”

Temas atuais também perpassam as tramas dos curtas da noite. Dirigido por Thiago Foresti, a produção brasiliense, “N.F.Trade”, usa como esteio o humor para falar sobre o impacto da tecnologia e do mundo virtual na vida das pessoas, enfim, nas relações afetivas e comerciais de todo mundo.

 

A trama, com poucas, mas boas sequências dirigidas, gira em torno da negociação de produtos orgânicos e o dilema é: qual a melhor forma de pagar: “Viu como é fácil comprar berinjela”, brinca um dos personagens.

 

Divulgação Produtora Tex Filmes

“Sayonara”

Com pegada de filmes de Quentin Tarantino, estética de ação, o paulista “Sayonara” – palavra nipônica que quer dizer adeus – vai da aventura ao suspense, passando pela crítica comportamental nesse que talvez seja o filme mais incômodo do FBCB.

 

Após quase atropelar um grupo de três amigos brutamontes em cima de faixa de pedestres, casal japonês é vítima de violência. “Volte para a sala de massagens”, cuspe um dos grandalhões.

 

É um alerta sobre os rumos sem limite que, de uns tempos para cá, ganharam a violência nas grandes metrópoles e também envolve a questão da intolerância racial, tão grave e comum como as guerras urbanas pelas ruas da cidade do país. A pergunta que fica ao final da sessão é… Houve necessidade de tanto sangue assim?

 

Assessoria de Comunicação da Secretaria de Cultura e Economia Criativa (Ascom/Secec)

E-mail: comunicacao@cultura.df.gov.br